A população do Distrito Federal
não se sente segura no Lago Paranoá. Não há placas ou indicações
de profundidade e os responsáveis por socorro e fiscalização têm
efetivo pequeno. Colisões de embarcações e mortes por afogamento
evidenciam a precariedade de estrutura em um dos principais
cartões-postais da capital, frequentado ainda mais nessa época em
que o calor bate recordes. No último sábado, oito pessoas ficaram
feridas em um acidente com lanchas e, em uma semana, pelo menos duas
pessoas perderam a vida em afogamentos.
Passava das 22h de sábado quando
duas lanchas se chocaram a cerca de 50 metros das margens do lago,
deixando oito feridos. Sujas de sangue, ambas as embarcações
estavam cheias de latas de cerveja e, segundo testemunhas, uma delas
trafegava em alta velocidade. A 1ª DP (Asa Sul) investiga se os
condutores eram habilitados e se haviam ingerido álcool. Os feridos
tiveram alta do hospital ontem.
O Corpo de Bombeiros não pôde
informar com exatidão o número de pessoas que perderam a vida nas
águas do lago artificial neste ano. Na última semana, porém, pelo
menos duas pessoas fazem parte dessa estatística. No feriado da
última segunda-feira, um jovem de 18 anos nadava próximo à
barragem quando desapareceu. Ele até chegou a ser encaminhado em
estado grave ao Hospital Regional do Paranoá, mas não resistiu a
uma parada cardiorespiratória.
Na quinta-feira, os bombeiros
resgataram o corpo de um homem que teria se afogado no mesmo local.
Ele pode ter ficado dois dias à deriva. Os casos não são isolados.
No primeiro semestre de 2015, cinco pessoas morreram no lago.
Ontem, a família do mestre de
obras Josué Lima, 35 anos, saiu de Samambaia para conhecer o Lago
Paranoá à beira da Ponte JK. “A gente só se sente seguro porque
é prudente, fica de olho o tempo todo. Não vi bombeiro,
policiamento, nada que garanta a segurança”, observou. “Achei
que fosse mais organizado”, afirmou a esposa dele, Cledineia da
Silva, 27.
Usuários
“enchem o tanque”
No piscinão o Lago Norte,
Francisco Ramos, 39, aluga equipamentos para os frequentadores. Por
lá, diz, uma lancha com três militares do Copo de Bombeiros chega
depois das 11h, e fica em ponto fixo até por volta das 17h. “Depois
disso é que as pessoas já beberam muito e entram na água. Tem
muito afogamento de crianças porque as mães estão cheias de
cachaça e não ligam para elas”, revela. Francisco diz ser comum
embarcações atracarem na areia “para encher o tanque de cachaça”.
“Já ajudei muita gente. Não é seguro. Precisamos de mais
bombeiros, garis, lixeiras, banheiros. Não tem nada”, reclama.
Versão
Oficial
Após o barco Imagination
naufragar, matando nove pessoas em 2011, o governo elaborou um Plano
de Segurança do Uso e da Ocupação do Lago. Mas o projeto de lei
foi retirado da pauta da Câmara Legislativa na troca de governo.
Procurado, o Instituto Brasília Ambiental (Ibram) informou que
defende que o uso do lago seja definido pela população. E lembrou,
em nota, da realização de audiências públicas: “O Ibram está
trabalhando em sete eixos: território, participação social,
jurídico, cultural, econômico, comunicação social e segurança”.
Bombeiros
estudam novo modelo de ação
O JBr. passou por diversos pontos
do lago e não viu placas avisando sobre perigos ou profundidade da
água, assim como não há salva-vidas nem fiscalização da
Marinha. Próximo à Ponte JK, no entanto, uma equipe de três
militares do Corpo de Bombeiros, com apenas um equipamento de
resgate, estava a postos. Antes, disseram os militares, não havia
pontos fixos e esse modo de trabalho está em estudo. “O ideal
seria que ficássemos em uma embarcação. A equipe, na verdade, não
dá. Não temos tempo de reação”, contou um deles.
Os bombeiros estudam essa nova
forma de abordagem. Até a semana passada, contou o tenente-coronel
Alan Araújo, duas unidades faziam a proteção ao salvamento
aquático, com pelo menos três mergulhadores, que também são
guarda-vidas. Aos fins de semana, duas outras equipes são
adicionadas – na Prainha, em ponto fixo. “Essa estrutura é o
máximo que temos”, disse.
“O
lago varia muito de profundidade e de correnteza. O problema é o
banhista eventual, que vai a pontos próximos à orla e tenta acessar
o centro. Embriaguez e falta de atenção são as principais causas
de afogamentos”, revelou.
Capitania:
ronda só com 3 militares
Com baixo efetivo, a Capitania
Fluvial de Brasília expõe os problemas. “Não temos material
humano nem físico suficiente para abordar todas as embarcações,
assim como a Polícia Rodoviária Federal não tem condições de
parar todos os veículos”, compara o tenente Gilberto Barbosa. O
ideal, diz, é que houvesse mais recursos humanos.
Em um barco, três militares
fiscalizam, abordam, autuam e apreendem embarcações irregulares.
Mesmo longe do litoral, o DF é a terceira unidade da Federação com
maior frota náutica do País: 5 mil. Aos fins de semana e feriados,
a média de ocupação é de cem embarcações.
Para circular, uma embarcação
precisa de registro junto à Marinha, habilitação do piloto e todos
os itens de segurança. A ausência dos requisitos pode levar a
punições como multa, que pode passar dos R$ 4 mil, cancelamento da
licença e apreensão do veículo. E o piloto não pode ingerir
bebida alcoólica.
De acordo com o Comando do 7º
Distrito Naval, até outubro deste ano, a inspeção abordou 927
embarcações, notificou 42 e apreendeu 21. Fevereiro foi o mês com
mais abordagens, 159, mas janeiro lidera os índices de veículos
retidos (5).
O Batalhão Ambiental Lacustre da
Polícia Militar atua em conjunto com o 5º Batalhão da PM.
Comandante do grupamento, o capitão Giuliano Enoki conta que são
quatro equipes de oito policiais fazendo as rondas pelo espelho
d‘água. “O efetivo é ordinário e aumenta em dias de evento”,
explica.
A maior concentração de pessoas
ocorre na Ermida Dom Bosco, Piscinão do Lago Norte e próximo à
Ponte do Bragueto. Para ele, o Lago Paranoá é, sim, um lugar seguro
do ponto de vista da criminalidade: “Os problemas são o uso de
bebida alcoólica e afogamentos”, diz.
Pedido
de organização
Guilherme Scartezini, coordenador
do Movimento Amigos do Lago Paranoá, lembra que a ocupação do lago
é sazonal. Nenhum órgão conseguiu confirmar, ao JBr., a média de
frequentadores. Apesar disso, ele afirma que “estamos no pico da
demanda”. A diferença de anos anteriores é que, agora, há mais
espaços a serem ocupados e, consequentemente, mais brasilienses
aproveitam o espelho d’água e mais acidentes podem acontecer.
“Tem
mais gente nadando, embarcando, morrendo, jogando lixo. Isso precisa
ser organizado e objeto de reflexão por parte das autoridades
competentes”, argumenta.
Fonte: Da redação do Jornal de
Brasília
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