A cada minuto, quatro ligações
de emergência são atendidas pela Central Integrada de Atendimento e
Despacho (Ciade) da Secretaria de Segurança Pública e Paz Social.
Dessas, uma é perdida por engano ou trote e 75% geram, de fato,
ocorrências. Somente no mês passado, 2.247 ligações consideradas
trotes foram registradas no Distrito Federal. A brincadeira sem graça
faz com que se perca tempo, dinheiro e até vidas.
As duas salas de atendimento
telefônico são barulhentas. Vozes se sobrepõem e novas ligações
acontecem assim que uma se encerra. Ali, trabalham 30 pessoas em
turnos de 12 horas. Todas são bombeiros ou policiais da reserva com
décadas de experiência nas ruas e tato com quem pede socorro. Neste
mês, eles ganharam reforço de pessoal e atualização no sistema,
que promete dar agilidade e precisão nas ocorrências, além de
diminuir o problema dos trotes.
Hoje, é difícil identificar e
combater ligações acidentais ou enganosas. No ano passado, elas
foram 1,017 milhão das 4,2 milhões de ligações recebidas na
Ciade. Outras 3,2 milhões, ou 75%, resultaram em ocorrências. De
acordo com os responsáveis pelo setor, representam um mal silencioso
para o sistema de segurança.
Um estudo do Senado Federal
concluiu que o prejuízo gerado pelos trotes ultrapassa a quantia de
R$ 1 bilhão por ano no Brasil. No DF, o subsecretário de Operações
de Segurança da Secretaria de Segurança Pública, coronel Márcio
Pereira, diz que não sabe quantificar os prejuízos financeiros. “É
uma excelente pergunta. Deveríamos saber e temos que mensurar isso”,
reconhece.
Ocorrências
reais são perdidas
Coordenador da Ciade, o
tenente-coronel Robson Cardoso ressalta que o foco é a
conscientização: “O trote impacta toda a população. Na medida
em que trato todas as ligações como emergência, quando a gente
manda recurso a uma ocorrência falsa, ele deixa de ser direcionado a
um local realmente emergencial. As corporações têm carência de
efetivo. Fazer um trote é agir contra si mesmo”.
Apesar de a secretaria divulgar
os números estimados de trotes, tanto o subsecretário de Operações
de Segurança quanto o coordenador da Ciade alertam: certamente não
representam a realidade. Até por isso o ano começou com mudança no
Sistema de Gerenciamento de Ocorrências. “O teleatendente não
tinha como distinguir o que era trote, ocorrência real e ligação
administrativa. O novo sistema vai possibilitar mensurar as
possibilidades”, revela o coronel Márcio Pereira. Agora, o
atendente visuliza um mapa da localização do chamado.
Punição
em lei
Quem passa trote comete um crime,
mas a punição é improvável. No Código Penal, dois artigos tratam
do delito. O 235 pune atentados contra a segurança ou o
funcionamento de serviços de utilidade pública, com pena de
reclusão de um a cinco anos, e multa.
No artigo 340, o responsável
pelo trote se enquadra em uma comunicação falsa de crime ou
contravenção, que prevê detenção, de um a seis meses, ou multa.
No entanto, não vale para situações em que não há o comunicado
de uma infração penal. Um projeto de lei que tramita desde o ano
passado na Câmara dos Deputados tenta criminalizar o trote.
Ligações
acidentais
“A
gente sabe que nem tudo é trote”, afirma o tenente-coronel Robson
Cardoso, responsável pela Ciade. “As ligações acidentais que
ficam em aberto, por exemplo, eram classificadas como trote. Por
isso, os números são discrepantes e não retratam a realidade”,
emenda. O foco, acredita, deve ser a conscientização para o fim dos
trotes, “porque custam vida, atendimentos, impostos, deslocamento”.
O que costuma acontecer é a
chamada ligação em espera, em que a pessoa não diz nada do outro
lado da linha por ter ligado sem querer ou por ser uma pessoa que não
pode falar, mas quer que se escute o que está acontecendo. Agora,
com o serviço de localização, será possível enviar equipes para
abordar e verificar o que acontece.
Da mesa de atendimento, a ligação
segue para a central de despacho, onde as corporações acionam as
viaturas e equipes para cobrir a ocorrência. Funciona sete dias por
semana e 24 horas por dia. Ali estão polícias Militar e Civil,
bombeiros, Detran, DER e Samu. Em casos excepcionais, como as
Olimpíadas deste ano, que terá jogos no DF, integram a equipe a
Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Comando Militar do
Planalto, Ao todo, somam 54 agências de segurança.
Tecnologia
deve demorar
O sistema que permite
identificação de rostos e placas só deve ser adquirido após a
conclusão do projeto inicial da instalação das câmeras. Mas,
segundo a SSP, o atual permite algumas ações inteligentes, como
identificar aglomerações ou dispersões momentâneas e objetos
abandonados.
Ainda
à espera de câmeras
Todas as mesas da central de
despacho ficam viradas para uma grande tela com imagens de câmeras
espalhadas pelo DF. A maioria do centro de Brasília, como a região
da Esplanada e Rodoviária do Plano Piloto. O tenente-coronel Robson
Cardoso explica que as câmeras estão em fase de implementação.
“Serão mais de três mil equipamentos com sistema de alerta para
monitorar”, estima.
O sistema de alerta deve permitir
que se identifiquem placa de veículos, rostos, pontos de queimada e
manifestações, mas não há prazo para que isso aconteça. A
instalação foi suspensa na troca de governo e 500 câmeras estariam
sem funcionar. “Sem o sistema, somos meros expectadores”, lamenta
o tenente-coronel.
Em nota, a Secretaria de
Segurança informou que, neste mês, receberá o diagnóstico sobre o
estado de conservação das 508 câmeras existentes. “O orçamento
inicial para a instalação de 835 câmeras é de R$ 26,3 milhões.
Desse total, já foram gastos R$ 15,6 milhões. A retomada dos
serviços e a instalação das demais câmeras previstas no projeto
inicial dependem do término do estudo, da previsão orçamentária e
de convênios a serem firmados”, explicou a pasta.
Ideal
seria dobrar efetivo
No início do mês, todas as
equipes da Ciade tiveram acréscimo de pessoal. A PM ganhou o maior
reforço e tem 107 profissionais no atendimento porque, segundo o
coronel Márcio Pereira, o 190 responde a 90% dos chamados. Apesar
disso, o aumento do efetivo ainda não é suficiente.
É o que diz o subsecretário de
Operações de Segurança, Márcio Pereira. “Se formos trabalhar
com o ideal, precisaríamos dobrar o efetivo, mas, hoje, não é
possível. Nesse momento, temos que contar com outras facilidades,
como a tecnologia, que possam reduzir o tempo de resposta e liberar o
atendente mais rapidamente”, conta. Atualmente, o tempo médio
entre o atendimento e o despacho é de 15 segundos.
Rotina
Entre um atendimento e outro em
que a ligação sequer chega a completar, o tenente Freitas, de 46
anos, conta sua rotina. Foram 16 anos nas ruas até integrar a
central. Antes de trabalhar na sala sem janelas, prestava os serviços
à população do Paranoá. Há quatro anos, atender às emergências
por 12 horas seguidas é sua função.
“É
uma realidade completamente diferente do que temos lá fora. Nos
quartéis, a gente não tem uma dimensão exata de como é o
atendimento e o despacho aqui no serviço de emergência.
Psicologicamente, é muito desgastante porque trabalhamos com
situações inusitadas. Todas as pessoas que ligam acham que o
problema delas é prioridade. Temos que fazer a triagem e priorizar
as ocorrências da melhor forma possível”, explica.
Salvo os momentos em que a
ligação serve para xingar ou gritar, os trotes são apenas uma
suspeita. Geralmente, ocorrem quando é intervalo na maior parte das
escolas. Mas as crianças e adolescentes não costumam sofrer nenhuma
sanção pelos atos. O máximo que acontece é levarem um sermão dos
atendentes. Porém, isso pode mudar com o serviço de localização.
“A
gente não pode descartar nenhum tipo de ocorrência”, explica o
tenente Freitas. “Não é toda criança que liga passando trote. Às
vezes, ela foi treinada para isso pelos pais. Temos que tentar fazer
a triagem da melhor forma possível para confirmar o caso”,
completa.
Saiba
mais
Além dos trotes clássicos e
infantis, há casos inusitados, como pessoas que ligam para tecer
elogios aos atendentes ou solitários que procuram uma conversa.
De acordo com o responsável pela
Ciade, há inúmeras ligações que não se completam por motivos
diversos. Uma desconfiança é que podem existir problemas com as
operadoras. O novo sistema poderá revelar o problema.
A Ciade recebe ligações pelo
190 (PM), 193 (bombeiros), 199 (Defesa Civil), 911 e 112.
Fonte: Da redação do Jornal de
Brasília
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