O
alistamento militar, que hoje é obrigatório para homens que
completam 18 anos, poderá se tornar facultativo para as mulheres. Ou
seja, a participação feminina no Exército, na Marinha ou na
Aeronáutica só deve acontecer se for espontânea no ano em que
completarem 18 anos. É o que prevê projeto da senadora Vanessa
Grazziotin, em análise final na Comissão de Relações
Exteriores e Defesa Nacional (CRE).
Se
aprovada na CRE, a proposta (PLS
213/2015),
que altera a Lei do Serviço Militar (Lei
4.375/1964),
deve seguir para votação na Câmara dos Deputados. Para Vanessa,
trata-se de uma proposta de ação afirmativa, proporcionando às
mulheres a oportunidade de seguir a carreira militar.
Embora
as Forças Armadas já incorporem mulheres em suas fileiras, a
senadora lembra que há restrição para o serviço de combatente.
Hoje as mulheres podem entrar nas Forças como militares apenas por
meio de concurso público para oficial, sargento ou profissional de
diferentes áreas (como médica, engenheira, bibliotecária, advogada
ou assessora de imprensa, por exemplo).
Vanessa
justifica que sua iniciativa observa a Constituição, uma vez que o
artigo 5º do texto iguala homens e mulheres em direitos e
obrigações.
— É
importante entender que nossa sociedade não é apenas composta por
homens e mulheres, mas é construída por ambos. Assim, está muito
atrasado o procedimento das Forças Armadas de impedir o exercício
do serviço militar pelas mulheres — disse.
A
proposta tem parecer favorável da relatora, Lídice da Mata
(PSB-BA), que incluiu uma emenda sobre o impacto orçamentário da
medida. A emenda determina que as despesas serão custeadas com
recursos específicos. Além disso, a senadora acolheu manifestação
do Ministério da Defesa, que informou sobre a necessidade de
adaptações dos órgãos de recrutamento para a admissão das
mulheres, como a construção de alojamentos e vestiários
apropriados e design de vestimenta específica.
Também
pela adequação orçamentária, a relatora sugeriu que haja um prazo
de dois anos (730 dias) a partir de uma futura sanção da lei para
que as mulheres possam, efetivamente, alistar-se.
O
diretor do Centro de Comunicação Social do Exército em Brasília,
coronel Alcides, lembra que as mulheres também têm ingressado no
Exército brasileiro como militares temporárias, tanto como oficiais
e sargentos, em diferentes áreas profissionais, exceto como
combatente.
Rotina
O
jovem incorporado em umas das mais de 500 organizações militares do
Exército brasileiro tem atividade diária intensa. De modo geral, o
recruta participa de sessões diárias de educação física e
instrução militar e, depois, segue para a formação de combatente
básico.
Em
seguida, ele passa por um período de qualificação, quando recebe
instrução específica das armas de infantaria, cavalaria,
artilharia, engenharia e comunicações, quadro de material bélico,
serviço de intendência e serviço de saúde, de acordo com a
organização militar onde foi incorporado.
Finalmente,
vem o período de adestramento, quando o jovem aprende como atuar
dentro de sua arma, quadro ou serviço. Durante o ano, são
realizados exercícios de campo, nas diferentes fases da instrução,
para a aplicação do conhecimento adquirido em sala de aula.
O
serviço militar inicial tem duração de 12 meses, podendo ser
acrescido de dois até seis meses, dependendo do interesse das
partes. Em caso de interesse nacional, como guerras, por exemplo, o
tempo de serviço militar poderá ir além dos 18 meses já
previstos, dependendo de autorização do presidente da República.
Seleção
Participar
do serviço militar é um sonho para muitas jovens brasileiras. Essas
meninas precisam se destacar para conseguir uma vaga na Escola
Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx), única porta de
entrada da linha bélica.
No
Exército, as mulheres são admitidas como militares de carreira
desde 1992, quando a então Escola de Administração do Exército,
atual Escola de Formação Complementar do Exército, com sede em
Salvador, matriculou a primeira turma de 49 mulheres em áreas como
magistério, administração e jornalismo.
Em
1997, o Instituto Militar de Engenharia, com sede no Rio de Janeiro,
matriculou a primeira turma de dez alunas no Quadro de Engenheiros
Militares. Em 2001, a Escola de Saúde do Exército, também do Rio
de Janeiro, permitiu a inscrição de mulheres para participar de
concurso público, realizado naquele ano. A partir de 2017, mulheres
ingressaram na EsPCEx sediada em Campinas (SP), para seguirem
carreira de oficiais combatentes e, na Escola de Sargentos de
Logística, para se formarem sargentos combatentes, na área
técnico-logística.
Para
o consultor do Senado Joanisval Gonçalves, embora seja um avanço
haver mulheres atuando em áreas historicamente masculinas, como
pilotos de caças aéreos, a participação feminina como combatente
ainda é um processo que passa por mudanças no Brasil. Segundo ele,
o fato de as Forças Armadas evitarem colocar mulheres na linha de
frente de combate não deve ser encarado como machismo. Gonçalves
afirma que esta postura é justificável porque a psicologia do
soldado muda, quando há presença de mulheres em áreas de conflito.
— A
própria natureza feminina desperta no homem o instinto do cuidado,
podendo gerar instabilidade na tropa — explicou.
Combate
Segundo
o Ministério da Defesa, o Exército brasileiro tem mais de 222 mil
pessoas em seu contingente. As mulheres, que atualmente ocupam cargos
administrativos e de saúde, correspondem a 4,32%. São apenas 9,6
mil soldados do sexo feminino.
De
acordo com levantamento socioeconômico da EsPCEx, estabilidade de
renda não é a principal razão para o ingresso na instituição,
uma vez que a remuneração de soldado é de cerca de R$ 956 e a de
aspirante a oficial, pouco mais de R$ 6,2 mil. O estudo constatou que
a maior parte dos ingressados na EsPCEx — 88% — afirmaram estar
satisfeitos com a farda por simples vocação.
Admiradora
do Exército e da farda, a policial militar Keliane Soares, de 27
anos, sempre se interessou pelo serviço de combatente, como forma de
desafiar limites e superar desafios. Mesmo ciente da baixa
remuneração e do treinamento pesado, que inclui desde rastejar na
lama a usar a mata como banheiro, dormir pouco e ter horários
apertados, ela teria se alistado, caso fosse permitido à época em
que ela completou 18 anos. Como não era, ela optou pela carreira na
segurança pública.
Para
Keliane, o ambiente considerado machista dos quartéis não deve ser
temido. Mesmo com características e capacidade física diferentes do
homem, ela acredita que a mulher consegue desempenhar qualquer papel
com destreza, caso queira.
— Não
importa se ela almeja a diretoria de uma empresa ou o comando das
Forças Armadas. A mulher cabe em todos os lugares, então vale a
pena lutar, se esse for o seu sonho — declarou.
Carreira
Oriunda
do Colégio Militar de Curitiba e ex-oficial do Comando Militar do
Leste, no Rio de Janeiro, a jornalista Sabrina Mancio, de 34 anos,
quis seguir a carreira desde a adolescência e ainda lembra da emoção
ao vestir a farda pela primeira vez, aos 21 anos.
Embora
a profissão exija sacrifícios como mudanças constantes de cidade e
horários indefinidos, Sabrina aconselha outras meninas a irem em
busca dos seus sonhos.
— É
admirável a postura de uma mulher fardada. Uma carreira que nos
enche de orgulho e nos ensina muito sobre o respeito à hierarquia e
a valores como a lealdade e o companheirismo, além do culto aos
símbolos nacionais — declarou.
Fonte:
Agência Senado.
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