Do Estadão
Por
6 votos a 5, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta
quarta-feira, 27, que o ensino religioso em escolas públicas, que é
facultativo, pode estar ligado a uma crença específica. Da mesma
forma, não há impedimento para que um religioso, um padre ou
pastor, por exemplo, dê a disciplina. Dessa forma, saiu vencida a
Procuradoria-Geral da República (PGR), que iniciou a discussão em
2010.
O
caso girou em torno de um acordo entre Brasil e o Vaticano, firmado
na Cidade do Vaticano em 2008. O decreto em questão, assinado pelo
então ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, previa que o
“ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas”
constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de
ensino fundamental.
Na
avaliação da PGR, a redação evidencia a adoção de um ensino
confessional, ou seja, com vinculação a certas religiões, o que
seria inconstitucional. A Procuradoria sustentava que a disciplina
deve ser voltada para a história e a doutrina das várias religiões,
ensinadas sob uma perspectiva laica.
“Não
vejo como se opor à laicidade a opção do legislador e não vejo
contrariedade aqui que pudesse me levar a considerar
inconstitucionais as normas questionadas”, disse a presidente do
STF, ministra Cármen Lúcia, que desempatou o julgamento.
“Não
vejo submissão do Estado à submissão de religião na norma. A
pluralidade de crenças, a tolerância – que é princípio da
Constituição Federal – combina-se com os dispositivos aqui
atacados. Pode-se ter conteúdo confessional em matérias não
obrigatórias nas escolas”, concluiu a ministra.
Além
de Cármen Lúcia, votaram a favor da possibilidade de o ensino
religioso ser confessional – ou seja, vinculado a religiões
específicas -, os ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Dias
Toffoli, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes. Coube a Moraes abrir a
divergência no julgamento. Em sentido contrário votaram o relator
da ação, ministro Luís Roberto Barroso, e os ministros Celso de
Mello, Marco Aurélio Mello, Luiz Fux e Rosa Weber.
Questão
Para
Celso de Mello, a fé é questão essencialmente privada no Estado
laico. “Ninguém pode ser coagido a fazer parte de associação
religiosa. Ninguém pode ser perguntado, indagado por qualquer
autoridade, acerca das suas convicções ou prática religiosa, nem
ser prejudicado por se recusar a responder. Ninguém é obrigado a
indicar sua religião. Ninguém pode ser obrigado a prestar juramento
religioso. Nesta República laica, o direito não se submete à
religião”, frisou.
Na
avaliação de Marco Aurélio Mello, a garantia do Estado laico obsta
que dogmas da fé determinem o conteúdo de atos estatais.
“Concepções morais religiosas, quer unânimes, quer majoritárias,
quer minoritárias, não podem guiar as decisões do Estado, devendo
ficar circunscritas à esfera privada. A crença religiosa e
espiritual – ou a falta dela, o ateísmo – serve precipuamente
para ditar a conduta e a vida privada do cidadão que a possui ou não
a possui. Paixões religiosas de toda ordem hão de ser colocadas à
parte na condução do Estado.”
Para
ele, a religião “embora aspecto relevante da comunidade, digno de
tutela na Constituição Federal, desenvolve-se no seio privado, no
lar, na intimidade, nas escolas particulares”. “Nas públicas,
espaço promovido pelo Estado para convívio democrático das
diversas visões de mundo, deve prevalecer a ampla liberdade de
pensamento, sem o direcionamento estatal a qualquer credo.”
Para
o ministro Luís Roberto Barroso, relator da ação, somente o modelo
não confessional de ensino religioso nas escolas públicas seria
compatível com o princípio de um Estado laico. Nessa modalidade,
explicou o ministro, a disciplina consiste na exposição neutra e
objetiva de doutrinas, práticas, aspectos históricos e dimensões
sociais das diferentes religiões. A posição do ministro, no
entanto, acabou derrotada.
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