NA
ÁREA DO CRIME - Bombeiros fazem aquilo que parece ter faltado à
Vale.
CÓRREGO
DO FEIJÃO, Brumadinho (MG), 2/2/2019 – A noite traz o silêncio da
dor, do luto. Tem sido assim, desde o 25 de janeiro, quando se
romperam as duas barragens de rejeito de minério de ferro da Mina
Córrego do Feijão, da VALE S/A, com rastro de enorme tragédia
humana. Contudo, mesmo no castigo da noite, seguem as atividades no
Centro de Comando das Operações das missões aéreas de resgate do
Corpo de Bombeiros e no Centro Comunitario, que absorveu as ações
de apoio em geral à comunidade. Nos locais (casas, igreja e o grupo
escolar) improvisados para alojar os bombeiros, o silêncio da
caserna é britânico.
Estou
no Centro Comunitário, onde, permanentemente, é servida
alimentação. São 20h de sexta-feira, 2. As tendas que abrigam do
sol, da chuva e do sereno já não ficam tão lotadas, como nas
primeiras noites. Os colegas jornalistas de Minas e de fora
retornaram para Belo Horizonte ou para os lugares próximos onde
conseguiram hospedagem.
De
repente, dois oficiais do Corpo de Bombeiros de MG chegam e fixam,
pelo lado de fora de uma janela, um mapa. As pessoas logo se
aproximam. Parece que esperavam por alguém da corporação, que
simboliza para todos alguma esperança. Há uma relação mútua de
sinceridade entre moradores e esses incansáveis cumpridores de
missões tão nobres.
O
oficial superior, major Ivan Neto, carregando sotaque que identifica
ter vindo de longe, cumprimenta a todos e apresenta o tenente Link.
Este já familiarizado nestes oito dias de resgates de vítimas vivas
e, agora, de corpos dos que não tiveram mesma sorte nessa
catástrofe. O major explica que o tenente-coronel Passos, agora o
comandante-geral das operações de resgate, esteve ali na noite
anterior, ficou voltar nesta, mas teve de cumprir outra tarefa e,
então, coube a ele comparecer.
De
forma pausada, como requer o momento, numa fala muito clara e
objetiva, ele explica o mapa, concluído há pouco. Os pontos
(números) aplicados sobre as áreas devastadas simbolizam os locais
de onde foram retirados corpos inteiros e segmentos. Explica todas as
formas de caracterização dos locais (escombros próximos, restos de
mobiliário, veículos, utensílios etc.) que possam facilitar nos
procedimentos subsequentes de identificação fora da “zona quente”
até os procedimentos do Instituto Médico Legal (IML) de
identificação da vítima.
“A
gente olha de cima, é uma imensidão de lama. O bombeiro lá embaixo
(dentro da área destruída, numa extensão de sete quilômetros, em
curvas, e até 1km de largura) é um pontinho. A gente precisa cada
vez mais de referenciais. Está hoje mais difícil (encontrar corpos,
com o solo mais seco e ficando compactado). Antes (com lama mais
molhada e água), encontrava na superfície. (Antes) Encontrava oito,
dez corpos por dia. Hoje, encontra um”, lamenta o oficial dos
bombeiros. Mas reafirma aos familiares e amigos das vítimas
compromisso e esperança: “A gente tem fé e esperança de
encontrar todos e entregar aos familiares para …” O militar,
acostumado a agir em tragédias, faz pausa, dá espaço à emoção e
não completa a frase. Todos compreenderam. Recuperada a voz,
completou sua mensagem com paralelo aos resultados dos resgates em
outra tragédia, também em mina da Samarco (da VALE e da BHP
Billiton) em Mariana, distante cerca de 90 km, no distrito de Bento
Rodrigues, outro rompimento de barragens. No outro município, entre
os que morreram, um corpo não foi até hoje encontrado. “O que a
gente quer é dar o direito a vocês de enterrar seus entes
queridos”.
Com
poucas interrupções, falou por quase 40 minutos.
“O
Corpo de Bombeiros chegou para salvar vítimas. Só que não tem sido
possível. A gente lamenta”, disse o oficial. Ele é lotado na
Sétima Companhia Independente do Corpo de Bombeiros, em Pouso
Alegre, no Sul de Minas, a quase 400 km daqui. “Eu me apresentei
como voluntário. Disse: eu quero ir para Brumadinho”.
HÁ
PERIGO
Falando
comigo e o repórter da TV Record SP, Rodrigo Vianna, o oficial disse
que ainda “há perigo de descer mais rejeito minério de uma das
represas que se romperam. “Há minério remanescente da barragem
B1”, afirmou. Ele não soube precisar o volume existente. Mostrou
um vídeo (no celular) feito por ele em um dos sobrevoos. Pelas
imagens, percebe-se, claramente, que ainda desce rejeito da barragem,
não em volume e velocidade assustadores.
A
OPERAÇÃO
O
major Ivan dá detalhes das buscas: os bombeiros começam as missões
por terra às 4h; às 6h, chegam os helicópteros à “base”
(campo de futebol) e aguardam as ordens de voos; as buscas são
encerradas, às vezes, por volta das 20h.
A
AÇÃO DAS EQUIPES
Na
“zona quente”, atuam 15 esquipes, formadas por oito a dez
militares (bombeiros de MG, ES, RJ, BA, GO, SP, DF e SC). No momento
em que um corpo e fragmentos são localizados, é comunicado (via
rádio) ao comando de tráfego aéreo, transmitindo as coordenadas
geográficas, marcação do ponto – cada um tem oito coordenadas.
Cada aeronave se desloca com três bombeiros. Os corpos são, então,
levados para a lateral da igreja (o interior é QG do Centro de
Operações – planejamento, controle do tráfego aéreo das 20 a 25
aeronaves dos Bombeiros, PMs e Civis de todos estados presentes, PRF,
PF, IEF-MG etc) e entregues à perícia da Polícia Civil/IML com
todas as identificações do local e proximidades.
NO
MAPA
“No
mapa, cada ponto azul é uma pessoa. A gente não consegue falar que
pessoa está no ponto e, às vezes, nem qual o número total de
pessoas ali (é que, as buscas retornam e podem identificar mais
pessoas no mesmo ponto)”, detalhou o major Ivan. Esclareceu que nem
sem sempre encontram documentos ou algum papéis como informa das
áreas de trabalho. “Pode haver erros (nas informações anexada
nas frentes de buscas). Mas o IML tem outras formas de saber quem é
a pessoa”, completou.
CONTAGEM
Há
descompasso entre a estatística final apresentada em Brumadinho, no
centro conjunto de coordenação para todas ações nessa tragédia,
e os resultados das operações de resgates. “O boletim sai às
18h, mas as operações acabam às 20h”, justificou o major Ivan.
Por isso, ocorrem diferenças de números, de até nove ou dez corpos
resgatados.
Até o balanço oficial do sábado, as estatísticas apresentavam 226 @desaparecidos e 121 corpos resgatados (99 identificados).
Até o balanço oficial do sábado, as estatísticas apresentavam 226 @desaparecidos e 121 corpos resgatados (99 identificados).
CONTINGENTE
Nas
operações estão 251 pessoas de resgate, e, de acordo com o major
Ivan, chegariam mais militares: São Paulo (45), Bahia (28), Brasília
(22) e da Força Nacional (56). Eles contam com apoio de 20 cães
farejadores de diversos de diversos estados.
FALTA
INFRAESTRUTURA
O
major relatou que há espaços para presença maior de bombeiros
militares. “Nós temos feito tudo que a gente poderia. Por que não
tem mais gente? Tem condições de colocar (mais gente na “zona
quente”). Só que a gente não tem mais logística (de acomodação
no Córrego do Córrego do Feijão”, esclareceu.
APELO
Ao
final da sua explanação, ouvida atentamente e poucas vezes
interrompida (e sem exaltação contra a VALE, pouco comum), o major
Ivan, como tem sido a atitude de todos os militares dos Corpos de
Bombeiros atuando aqui nestes oito dias, surpreende: “Fiquem à
vontade, gente! Vamos lá, mais alguma pergunta que possa ajudar e
colaborar?”. Depois de responder às perguntas, o oficial fez um
apelo: “A gente pede a vocês que não entrem na área quente”.
Esclareceu que até militares têm se acidentado nas áreas dos
resgates.
Fonte: Jornalistas Livres
Leia também: MAIS DE 70 ANIMAIS SÃO RESGATADOS APÓS TRAGÉDIA EM BRUMADINHO
Leia também: MAIS DE 70 ANIMAIS SÃO RESGATADOS APÓS TRAGÉDIA EM BRUMADINHO
0 Comentários
Obrigado pela sugestão.