Banner Acima Menu INTERNAS

Entenda como funciona o sistema penitenciário federal e como a fuga de dois presos ligados ao CV foi possível

Por Rhuan C. Soletti
A fuga, naturalmente, levanta questionamentos sobre a segurança do sistema, considerado modelo no processo de execução penal. Autoridades agora buscam compreender se a evasão foi resultado de oportunidade ou se contou com ampla assistência externa – ou interna, indicando uma possível conexão entre atos criminosos.
O presidente da Comissão de Segurança Pública da Câmara, deputado Sanderson (PL-RS), afirmou que convocou o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, para prestar esclarecimentos diante da comissão. Sanderson permanecerá como membro do colegiado, embora deva deixar a liderança da comissão nas próximas semanas, quando houver novas eleições para as comissões da Casa.
"Vamos cobrar todas as informações a respeito e a imediata apuração sobre as gravíssimas fugas. O novo ministro da Justiça será convocado", afirmou Sanderson. "Essas fugas são desastrosas e emblemáticas, porque nunca havia acontecido uma única fuga do sistema prisional federal, que conta com cinco presídios federais", acrescentou. Já o deputado federal Rodolfo Nogueira (PL-MS), disse que é “inadmissível que fugas ocorram em presídios federais". 
Lewandowski, que assumiu o cargo em fevereiro (1), foi convocado e ordenou uma revisão imediata e abrangente de todos os equipamentos e protocolos nas cinco unidades de segurança máxima. Em resposta à situação, a direção da penitenciária potiguar foi afastada, e um interventor foi nomeado para a unidade. Então, diversas medidas emergenciais foram adotadas, como a suspensão do banho de sol e visitas, incluindo as de advogados, nos dias 15 e 16 de fevereiro.
O Ministério da Justiça ainda não confirmou a informação sobre um rumor: a fuga supostamente ter ocorrido através de um buraco nas telas, e o horário exato do incidente permanece desconhecido. A estrutura prisional, que inclui um solário fechado por telas e um rigoroso monitoramento com câmeras e policiais penais armados, enfrenta agora escrutínio diante do ocorrido. 
Em meio às investigações, um policial penal, que já atuou em Mossoró, comentou à Gazeta:
"Nos provoca estranheza que serviços de inteligência tenham desmantelado esquemas como o de captura programada do Marcola em 2019 e não tenham conseguido identificar o risco desses presos fugirem do sistema em Mossoró, o que nos leva a crer que foi algo de oportunidade. Mas alguma falha houve e isso vem sendo apurado."
O Ministério da Justiça anunciou a intervenção na unidade, buscando identificar se a fuga ocorreu por oportunidade ou foi cuidadosamente planejada, com possível interferência ou conivência, enquanto a Polícia Federal (PF) instaurou um inquérito para investigar os detalhes da fuga.
Os fugitivos
Deibson Cabral Nascimento e Rogério da Silva Mendonça, os fugitivos da Penitenciária Federal de Mossoró, ingressaram no sistema penitenciário federal em setembro de 2023, após serem transferidos do Acre. Antes disso, estavam sob custódia no Complexo Penitenciário de Rio Branco, mas uma rebelião de grandes proporções, articulada por eles, resultou na mudança para uma unidade federal. 
A rebelião, ocorrida em julho do ano passado, deixou cinco mortos, sendo três deles decapitados, além de dezenas de feridos. A articulação do motim foi determinante para pelo menos outros 12 detentos serem encaminhados a unidades federais na mesma ocasião. 
Segundo informações do Instituto de Administração Penitenciária do Acre (Iapen-AC), os dois criminosos acumulam condenações acumuladas de 155 anos. Rogério da Silva Mendonça enfrenta uma pena de 74 anos de prisão, enquanto Deibson Cabral Nascimento soma uma condenação de 81 anos. Após a fuga dos membros do Comando Vermelho em Mossoró, foram intensificados os protocolos de segurança e reforçados os esquemas de vigilância interna e externa em todas as unidades prisionais federais. 
Por que existem tais presídios?
Criado em 2006, o sistema penitenciário federal surgiu como uma resposta direta ao combate ao crime organizado, buscando isolar lideranças criminosas e detentos de alta periculosidade. Ao contrário dos sistemas estaduais e do Distrito Federal, a gestão das penitenciárias federais fica sob a responsabilidade do Ministério da Justiça e Segurança Pública, caracterizando-se pelo “mais alto nível de monitoramento no sistema prisional brasileiro”, que agora foi posto em cheque.
Segundo a Secretaria Nacional de Políticas Penais, a transferência para o sistema federal requer que o detento atenda a certos critérios, como ser uma liderança ou desempenhar papel relevante em uma organização criminosa, além de participar de uma quadrilha ou bando envolvido em práticas reiteradas de crimes com violência ou grave ameaça.
Nomes conhecidos, como Fernandinho Beira-Mar, Marcola, Marcinho VP e Nem da Rocinha, já passaram pelo sistema penitenciário federal. O prazo inicial de permanência nas unidades de segurança máxima é de três anos, podendo ser prorrogado conforme a necessidade. As prisões de segurança máxima estão distribuídas em cinco localidades estratégicas pelo país, sendo elas:
  • Catanduvas (PR)
  • Campo Grande
  • Mossoró (RN)
  • Porto Velho
  • Brasília
Estrutura e funcionamento do presídio


Apesar da Mossoró ser o segundo maior município do Rio Grande do Norte, a penitenciária está localizada em uma área isolada, aproximadamente 15 quilômetros do centro da cidade, no quilômetro 12 da rodovia estadual RN-15, que conecta Mossoró a Baraúna. A unidade, a terceira construída pela União, faz parte das cinco unidades de segurança máxima federais no país.
Ao ingressar no presídio, o detento passa 20 dias em uma cela de inclusão, separada das celas definitivas. Durante esse período, os agentes apresentam toda a nova rotina ao preso e entregam um documento impresso que esclarece todos os seus direitos e deveres. Além disso, o preso recebe um kit com uniformes – bermuda, calça, camiseta e blusa de inverno – e materiais de higiene pessoal – escova e pasta de dente, sabonete, desodorante e toalha.
Durante o período de inclusão na penitenciária de Mossoró, a equipe realiza uma avaliação completa do quadro clínico do detento, considerando necessidades especiais e restrições alimentares, se houver. Esta análise visa assegurar o atendimento adequado às condições de saúde de cada preso.
Com uma área total de 12,3 mil metros quadrados, ela é considerada “um exemplo” de estrutura penitenciária federal destinada a manter a segurança e o controle rigoroso dos detentos. Dividida em quatro pavilhões, com 12 celas de isolamento para presos recém-chegados ou aqueles que violam as regras, a penitenciária adota medidas específicas para garantir a ordem.
O monitoramento constante é uma prática essencial, com cada movimento do preso sendo observado. Cada cela, com sete metros quadrados, é equipada com dormitório, sanitário, pia, chuveiro, uma mesa e um assento. O chuveiro é acionado em horários determinados, a alimentação é entregue por uma portinhola e cada bandeja é minuciosamente inspecionada.
A segurança é reforçada por câmeras de vídeo, operando 24 horas por dia, de acordo com informações do governo federal. Dentro das celas, não são permitidas tomadas ou equipamentos eletrônicos, e as mãos dos detentos devem permanecer algemadas durante o trajeto da cela até o pátio onde ocorre o banho de sol. 
Sempre que há a necessidade de deslocamento dos detentos para fora das celas, eles são informados verbalmente sobre a realização de revistas visuais. Durante o banho de sol, todas as atividades são rigorosamente acompanhadas, inclusive por meio de videomonitoramento. Nas penitenciárias federais, as visitas são restritas ao parlatório e à videoconferência. 
Existe também um “aspecto educacional”, os presos têm a oportunidade de participar de aulas de Educação Básica e ensino profissionalizante, com o suporte de pedagogos. Nas celas, é permitido que os detentos mantenham livros “pedagógicos”, um livro religioso, como a Bíblia, além de revistas ou um livro escolhido entre os disponíveis. Esses materiais podem ser utilizados para atividades como a produção de resenhas, o que contribui para a remição da pena.

Postar um comentário

0 Comentários