Por Luiz Fernando Ramos Aguiar
A decisão unilateral do Supremo Tribunal Federal de reconhecer às guardas municipais funções de polícia tem causado uma série de desdobramentos, desde a oposição de entidades de classe até a mobilização de governos municipais para adaptar suas forças às novas regras. Resta saber se a decisão será uma janela de oportunidade para melhorar a segurança pública da população ou se se tornará mais uma peça na engrenagem burocrática e ineficiente do Estado brasileiro. Mesmo que a decisão não tenha respeitado o processo legislativo e tenha sido tomada sem uma discussão efetiva no Parlamento e na sociedade, essa pode ser uma oportunidade única para descentralizar as políticas de segurança pública e regularizar as ações que, na prática, os profissionais de segurança dos municípios já exercem.
A primeira coisa que precisa ficar clara é a evidente oposição da interpretação do STF ao texto constitucional. O parágrafo 8º do artigo 144 da Constituição Federal trata da atribuição dos municípios na constituição das guardas, sendo claro ao destinar essas forças à proteção dos bens, serviços e do patrimônio das cidades.1 Não se trata aqui de ser contra ou a favor da decisão, mas de observar que vivemos uma era singular da história da Suprema Corte brasileira, em que o texto constitucional não é necessariamente o norte das decisões, mas sim a conveniência política ou ideológica dos membros da Corte.
Mesmo os mais fervorosos defensores das prerrogativas policiais das guardas precisam reconhecer que a definição das novas atribuições não respeitou o processo legislativo. Uma mudança dessa magnitude deveria ter sido realizada por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). O que os defensores da decisão não entendem é que esse tipo de atropelo gera uma insegurança jurídica imensa, não apenas para as guardas, mas para todas as forças de segurança do país. Afinal, se uma decisão do Tribunal pode alterar preceitos constitucionais, quem pode garantir que, em caso de um clamor social ou de uma conveniência política diferente, novas decisões não possam ser tomadas? E não apenas no campo das atribuições das polícias, mas também, por exemplo, nas garantias previdenciárias ou funcionais de seus integrantes.
A associação Defenda PM, que congrega quase 2 mil oficiais da PM paulista, já manifestou seu posicionamento contra a decisão de dotar as guardas das competências de polícia. Até mesmo a mudança de nome da instituição foi questionada, já que a associação argumenta que a Constituição não denomina as guardas municipais como polícias. Existem rumores de que a associação deve acionar o Supremo para tentar reverter a decisão.2 É possível que, neste momento, não exista grande possibilidade de reversão, mas o problema é justamente essa insegurança e volatilidade nas decisões da Corte, que colocam as corporações e a população em suspense. Afinal, mudanças nas conjunturas políticas e sociais, além da pressão da opinião pública, podem dissuadir nossos ministros da decisão de transformar as guardas em forças policiais.
E esse é o grande problema da decisão: não trazer tranquilidade e estabilidade suficientes para a construção de estratégias e políticas de segurança voltadas à execução a longo prazo.
Como é comum no Brasil, existem leis que “pegam”, enquanto outras afundam no ostracismo. E, ao que tudo indica, muitas prefeituras estão se mobilizando para organizar suas forças policiais, para que de alguma forma essa “nova lei” peqgue. Dessa forma, qualquer alteração posterior ficará comprometida pela dificuldade de retirar de atividade ou reduzir as atribuições de forças policiais que já estejam em operação. Seriam decisões frontalmente contrárias à opinião pública — carente de segurança —, às polícias municipais — que contam com associações atuantes e fortes lobbies — e às forças políticas, que não estarão dispostas a abrir mão dos avanços conseguidos, que são apresentados à população como incremento nas políticas de segurança pública.
Apesar da decisão do STF, na prática, ter o potencial de trazer avanços para segurança pública, a forma como essas mudanças foram apresentadas representam o que exite de pior atualmente no cenário político brasileiro. Tribunais que se desviam de suas atribuições, mesmo que com as melhores intenções, corrompem o sistema legal que deveriam proteger. E quando não existe estabilidade e segurança jurídica suficientes para garantir a operação da instituições fundamentais para democracia, como as forças policiais, vivemos um momento de extremo perigo para a democracia.
Mais do que uma mudança sobre a organização das polícias no país a decisão do STF é ponto de inflexão para o diagnóstico do estado do império das leis em nosso país.
A decisão unilateral do Supremo Tribunal Federal de reconhecer às guardas municipais funções de polícia tem causado uma série de desdobramentos, desde a oposição de entidades de classe até a mobilização de governos municipais para adaptar suas forças às novas regras. Resta saber se a decisão será uma janela de oportunidade para melhorar a segurança pública da população ou se se tornará mais uma peça na engrenagem burocrática e ineficiente do Estado brasileiro. Mesmo que a decisão não tenha respeitado o processo legislativo e tenha sido tomada sem uma discussão efetiva no Parlamento e na sociedade, essa pode ser uma oportunidade única para descentralizar as políticas de segurança pública e regularizar as ações que, na prática, os profissionais de segurança dos municípios já exercem.
A primeira coisa que precisa ficar clara é a evidente oposição da interpretação do STF ao texto constitucional. O parágrafo 8º do artigo 144 da Constituição Federal trata da atribuição dos municípios na constituição das guardas, sendo claro ao destinar essas forças à proteção dos bens, serviços e do patrimônio das cidades.1 Não se trata aqui de ser contra ou a favor da decisão, mas de observar que vivemos uma era singular da história da Suprema Corte brasileira, em que o texto constitucional não é necessariamente o norte das decisões, mas sim a conveniência política ou ideológica dos membros da Corte.
Mesmo os mais fervorosos defensores das prerrogativas policiais das guardas precisam reconhecer que a definição das novas atribuições não respeitou o processo legislativo. Uma mudança dessa magnitude deveria ter sido realizada por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). O que os defensores da decisão não entendem é que esse tipo de atropelo gera uma insegurança jurídica imensa, não apenas para as guardas, mas para todas as forças de segurança do país. Afinal, se uma decisão do Tribunal pode alterar preceitos constitucionais, quem pode garantir que, em caso de um clamor social ou de uma conveniência política diferente, novas decisões não possam ser tomadas? E não apenas no campo das atribuições das polícias, mas também, por exemplo, nas garantias previdenciárias ou funcionais de seus integrantes.
A associação Defenda PM, que congrega quase 2 mil oficiais da PM paulista, já manifestou seu posicionamento contra a decisão de dotar as guardas das competências de polícia. Até mesmo a mudança de nome da instituição foi questionada, já que a associação argumenta que a Constituição não denomina as guardas municipais como polícias. Existem rumores de que a associação deve acionar o Supremo para tentar reverter a decisão.2 É possível que, neste momento, não exista grande possibilidade de reversão, mas o problema é justamente essa insegurança e volatilidade nas decisões da Corte, que colocam as corporações e a população em suspense. Afinal, mudanças nas conjunturas políticas e sociais, além da pressão da opinião pública, podem dissuadir nossos ministros da decisão de transformar as guardas em forças policiais.
E esse é o grande problema da decisão: não trazer tranquilidade e estabilidade suficientes para a construção de estratégias e políticas de segurança voltadas à execução a longo prazo.
Como é comum no Brasil, existem leis que “pegam”, enquanto outras afundam no ostracismo. E, ao que tudo indica, muitas prefeituras estão se mobilizando para organizar suas forças policiais, para que de alguma forma essa “nova lei” peqgue. Dessa forma, qualquer alteração posterior ficará comprometida pela dificuldade de retirar de atividade ou reduzir as atribuições de forças policiais que já estejam em operação. Seriam decisões frontalmente contrárias à opinião pública — carente de segurança —, às polícias municipais — que contam com associações atuantes e fortes lobbies — e às forças políticas, que não estarão dispostas a abrir mão dos avanços conseguidos, que são apresentados à população como incremento nas políticas de segurança pública.
Apesar da decisão do STF, na prática, ter o potencial de trazer avanços para segurança pública, a forma como essas mudanças foram apresentadas representam o que exite de pior atualmente no cenário político brasileiro. Tribunais que se desviam de suas atribuições, mesmo que com as melhores intenções, corrompem o sistema legal que deveriam proteger. E quando não existe estabilidade e segurança jurídica suficientes para garantir a operação da instituições fundamentais para democracia, como as forças policiais, vivemos um momento de extremo perigo para a democracia.
Mais do que uma mudança sobre a organização das polícias no país a decisão do STF é ponto de inflexão para o diagnóstico do estado do império das leis em nosso país.
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