Seja
por efeito da recessão, seja por temor do retorno de um governo mais
protecionista, empresas importantes, como a montadora japonesa Honda,
a fabricante de motores MWM e a gigante de bens de consumo
Kimberly-Clark, têm deixado, discretamente, o mercado argentino nos
últimos meses.
A
crise econômica no país vizinho está impactando principalmente os
projetos de médio e longo prazos das empresas do setor automotivo
local, o principal destino dos carros “Made in Brazil”. Além da
redução de quadro de funcionários e fechamento de alguns turnos de
trabalho, as quedas consecutivas nas vendas obrigam as empresas a
deixar o país e a transferir as atividades para mercados da região,
principalmente o Brasil. É o caso da MWM, a tradicional fabricante
de motores diesel, que fechou a sua planta de produção na
Argentina.
Controlada
pela americana Navistar, a empresa não detalha as razões que a
fizeram fechar a planta em Jesús María, na província de Córdoba,
região Centro-Norte do país. Em comunicado interno, a MWM Argentina
informou apenas que a operação no país se tornou inviável. “Nem
todas as decisões estão associadas ao resultado das urnas, mas é
evidente que muitas empresas ficaram temerosas com a volta de
políticas mais restritivas ao comércio internacional”, disse o
economista Antônio Favano Neto, especialista em economia
latino-americana pela Fundação Getulio Vargas (FGV).
A
unidade da MWM, inaugurada em 1995, junto com a fábrica da GM, em
Canoas, no Rio Grande do Sul, produzia o motor da Chevrolet S10,
modelo que saiu de linha em 2015. Com a decisão, a unidade de
Córdoba demitiu 100 empregados. Além de atender à GM, a MWM
produzia também motores diesel para Ford e Mercedes-Benz. No
entanto, a crise dos últimos anos resultou no encerramento da
produção de propulsores. A empresa passou a fabricar apenas peças
para abastecimento das linhas que ficavam no Brasil.
A
produção local, segundo a empresa, será transferida para o Brasil,
provavelmente reforçando as atividades de sua fábrica em São
Paulo. Com essa transferência, a MWM International centrará suas
operações de produção de motores diesel e componentes no Brasil,
onde chegou em 1953, ainda sob o controle da Motoren Werke Mannheim,
sendo assim filial da empresa alemã homônima, que foi fundada em
1922. Em 1985, a então MWM Motores Diesel Ltda. foi adquirida pela
Deutz AG, que vendeu seu controle para a Navistar International em
2005.
A
Kimberly-Clark foi outra gigante que, no último mês, anunciou o
fechamento de sua fábrica localizada em Bernal, Buenos Aires. A
empresa foi fundada em 1904, pela General Match Company. Desde a
inauguração, a unidade passou por diferentes proprietários, até
que, em 1997, foi adquirida pela multinacional americana.
A
fábrica era responsável por produzir diversos produtos das marcas
Kleenex e Scott, como papel higiênico, papel toalha, lenços faciais
e guardanapos, entre outros produtos. A empresa anunciou que se
concentrará na fabricação de fraldas em suas outras duas fábricas,
em Pilar e San Luis.
INVESTIMENTO
Apesar
do fechamento de uma de suas fábricas, a Kimberly-Clark continuará
com o restante de seus investimentos, de acordo com o portal
especializado no setor, Tissue On-line. Segundo a multinacional, a
Argentina continua sendo um mercado importante para a empresa. Por
meio de suas operações, produz e exporta para quatro países da
região, empregando mais de 1 mil funcionários no país.
“O
fechamento de uma unidade é parte de um inevitável processo de
ajuste às demandas locais”, justificou a empresa. A Kimberly-Clark
tem uma fábrica em Pilar, dedicada principalmente ao desenvolvimento
de produtos de proteção feminina e adulta. Além disso, é dona
também de uma planta no parque industrial da província de San Luis,
cujo o foco será na produção de fraldas para crianças e adultos.
A
planta industrial é considerada uma das três maiores naquela
província, o que a torna uma unidade modelo para operações na
América Latina, sendo a segunda em níveis de produção na região.
Em 1997, a Kimberly-Clark e a Klabin formaram uma joint venture
chamada KCK Tissue SA, que adquiriu a fábrica da Celulosa Argentina,
atualmente propriedade exclusiva da Kimberly-Clark.
No
caso da montadora japonesa Honda, a empresa decidiu suspender a
produção do HR-V e seguir montando apenas motocicletas. No local, a
empresa faz motos desde 2006. Hoje em dia, monta os modelos Wave, CG
150 e XR 150L. Em comunicado, a companhia informou que “continuará
com a comercialização de automóveis e os serviços pós-vendas no
país”.
A
produção de veículos no Brasil tem sido afetada pela Argentina,
que é o maior importador de carros da indústria brasileira. Em
julho, o número de unidades de veículos exportados do Brasil caiu
15,3% – de 49.705 para 42.115 –, na comparação com o mesmo mês
de 2018. A fábrica fechada fica nos arredores de Campana, região
metropolitana de Buenos Aires. A fabricante afirma que o modelo
continua sendo vendido no mercado argentino e que será importado de
outros locais.
Estagnação
no vizinho vai afetar Brasil em 2020, diz estudo
Estudo
elaborado pelo Instituto Brasileiro de Economia (FGV IBRE) aponta que
a crise econômica da Argentina pode ter feito o PIB do Brasil deixar
de crescer 0,5 ponto percentual em 2019. De acordo com a pesquisa, o
principal motivo seria a queda de 40% nas exportações brasileiras
para a Argentina, nos oito primeiros meses de 2019.
“A
ideia do estudo não foi apenas mapear essas relações entre
política e economia, mas tentar quantificar quais seriam os efeitos
observados do choque argentino sobre o crescimento brasileiro",
disse o pesquisador sênior da área de Economia Aplicada do
FGV-Ibre, Lívio Ribeiro, em entrevista à agência Sputnik.
“Empresas brasileiras têm uma participação relevante no mercado
argentino e a demanda argentina tem uma participação relevante no
faturamento dessas empresas.”
O
economista destacou os resultados da pesquisa que mostraram que a
crise econômica argentina gerou “efeitos negativos sobre o PIB
brasileiro de 2018, na ordem até -0,3%, e este ano, efeitos da ordem
de 0,5%”. Segundo ele, um eventual governo protecionista e a
redução da atividade econômica do país vizinho pode comprometer a
recuperação do Brasil no ano que vem.
INCERTEZA
“Ainda
não sabemos qual será a diretriz do novo governo argentino, mas
2020 tende a ser um ano em que a Argentina tira o crescimento da
economia brasileira. O problema é que, neste momento, dada a total
incerteza do que vai acontecer, é muito difícil quantificar, ainda
que a direção pareça muito clara", completou. Há duas
semanas, os argentinos foram às urnas e elegeram como presidente o
peronista Alberto Fernández e, como vice, a ex-presidente Cristina
Kirchner. (JM e NC).
Fonte:
Correio Braziliense
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