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Com recorde de queimadas e fumaça no Amazonas, governo Lula patina no combate à crise


Há mais de dois meses, os amazonenses sofrem com a maior seca em 121 anos, o transporte fluvial interrompido, falta de alimentos e remédios, e frequentes nuvens de fumaça em Manaus, causadas pelo recorde de queimadas no Estado. O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que divulga a pauta ambiental como uma de suas bandeiras, patina para responder à crise na região, onde vivem 38 milhões de brasileiros. O próprio Ibama admitiu ao Estadão a estrutura insuficiente no combate ao fogo. “Obviamente a gente tem de se planejar melhor, ter estruturas melhores”, disse Rodrigo Agostinho, presidente do órgão. 
As cenas dos últimos meses foram de rios que deram lugar a paisagens áridas, centenas de botos mortos e comunidades isoladas. Nas redes sociais, vídeos e mensagens documentam a rotina de poeira sobre a capital amazonense, onde os moradores são obrigados a até a retomar as máscaras para proteger a saúde.
Até agora, foram anunciados quase R$ 700 milhões para tentar solucionar a crise social e ambiental, mas a falta de soluções efetivas desencadeia cobranças por parte da oposição e do Ministério Público Federal (MPF). Também motiva críticas sobre a necessidade de preparar melhor o País para eventos climáticos extremos. Há meses, por exemplo, a comunidade científica internacional já alertava que El Niño iria agravar a seca no Norte do País este ano e em 2024.             
Isso significa também, segundo especialistas, que não adiantará apenas repetir as estratégias antidesmate que funcionaram no primeiro governo petista. O cenário agora é de uma floresta mais degradada, ocupada pelo crime organizado. As queimadas também serão uma dor de cabeça na Cúpula do Clima (COP-28) este mês, nos Emirados Árabes, quando o governo será cobrado a mostrar resultados após as promessas de ação ambiental feitas no início do ano.                  
Lula não foi à região da floresta para tratar da crise. Há um mês, enquanto o petista se recuperava da cirurgia no quadril, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) visitou o Amazonas junto da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e de outros colegas de Esplanada.                   
Lá, anunciaram R$ 627 milhões para áreas como Saúde, Defesa Civil, Meio Ambiente, Segurança e Desenvolvimento Social. No pacote, anteciparam R$ 100 milhões em emendas para o Estado, liberados após cobrança de parlamentares da região. Além da insuficiência da resposta, o colapso ambiental põe em xeque o planejamento do governo.                    
O Ibama diz ter aumentado em 18% o total de brigadistas: são 2.101, sendo 1.356 na Amazônia Legal, e aumentado o orçamento. Pressionado, agora o governo pretende pedir verba do Fundo Amazônia para reforçar o combate ao fogo. O problema é que o envio do projeto de reforço orçamentário é previsto para o fim do ano e cuja liberação do dinheiro depende ainda dos trâmites do Fundo Amazônia. Enquanto isso, as queimadas não dão sinal de trégua.
Segundo o Ministério do Meio Ambiente, há “crédito pré-aprovado pelo Fundo Amazônia de R$ 35 milhões para prevenção e combate a incêndios pelo Corpo de Bombeiros local, dependendo apenas da apresentação de projeto”. Cerca de R$ 5 milhões, diz a pasta, foram destinados a ações do Ibama e do ICMBio, incluindo gastos com brigadistas, aeronaves, helicópteros e resgate de fauna.                    
Além disso, especialistas dizem que a contratação emergencial de brigadistas e equipamentos é importante, mas é necessário planejamento estratégico para atacar as raízes do problema, sob risco de apenas enxugar gelo e ver os problemas se repetirem de forma mais grave em 2024.                     
“Toda a população brasileira (poderia ser chamada) para ser brigadista e ainda assim não seria suficiente para combater incêndios na Amazônia. A área é muito grande, com lugares de difícil acesso, um trabalho árduo”, afirma Erika Berenguer, pesquisadora da Universidade Oxford (Reino Unido)                  
“Entendo ser um ano de reestruturação dos órgãos ambientais, que estavam extremamente sucateados e o número de servidores diminuiu. Há uma herança maldita na área, mas havia coisas que davam para fazer”, diz a bióloga. Entre essas ações, está o uso de informações de pesquisas e dados de monitoramento remoto para antecipar territórios mais suscetíveis a queimadas. O Ibama fala, por exemplo, que 3/4 do fogo tem origem em áreas já desmatadas.                   
Após um evento no Inpe em março, um grupo de pesquisadores ligados a diferentes instituições, como Oxford, Embrapa e Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), apresentou documento com indicações para proteger florestas degradadas. Entre as medidas apontadas estão: 1) Criar um fundo emergencial para anos de secas extremas 2) Formalizar um grupo técnico-científico para auxiliar o Ministério do Meio Ambiente 3) Definir territórios prioritários e 4) Aprimorar análises de áreas degradadas por incêndios.
Famílias ribeirinhas sofrem para receber comida
“Temos problema de navegabilidade para chegar produto às famílias ribeirinhas e abastecimento das cidades. Tem de caminhar às vezes 2 a 3 quilômetros naquela área de várzea, comprometida, para chegar o alimento”, relata o prefeito de Rio Preto da Eva, Anderson Sousa, da Associação Amazonense de Municípios (AAM). “O rio secou, uma mortandade de peixe nunca vista. Nosso campo está queimado e o gado não tem como se alimentar. Há poços artesianos que, em vários municípios, estão com lençol freático comprometido.”                   
Segundo ele, há ajuda federal, mas muitos municípios tiveram problemas para se adequar ao sistema de repasse dos recursos. Ao menos 17 prefeituras chegaram a ter processos devolvidos pela União por inconsistências nos registros. A associação fez mutirão para corrigir as falhas e facilitar o envio de verbas. 
“Na Amazônia, em que há infraestrutura de transporte de abastecimento dependente do transporte fluvial, ao prever secas longas e intensas, é preciso ter estrutura pronta, apta a garantir suprimentos”, afirma Beto Mesquita, membro da Coalizão Brasil e diretor de Florestas e Políticas Públicas da BVRio. “É preciso repensar que regiões terão alternativas de transporte para dar resposta rápida e não colapsar o sistema de distribuição de suprimentos, especialmente de alimentos, água potável e medicamentos.”               
Estadão

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