Na contramão da memória de um dos episódios mais brutais do jornalismo brasileiro, a revista britânica Dazed publicou, nesta segunda-feira (2), uma entrevista com o funkeiro Oruam — filho de Marcinho VP, conhecido líder da facção criminosa Comando Vermelho. A matéria, que coincide com os 23 anos do assassinato do jornalista Tim Lopes, retrata Oruam como um “poeta da favela” e aposta numa abordagem que humaniza a trajetória do artista.
O ponto mais polêmico da reportagem, no entanto, foi a escolha do dia para publicação e a imagem utilizada no ensaio fotográfico. Em uma das fotos, Oruam aparece segurando um fuzil estilizado com câmeras fotográficas — uma referência direta à principal ferramenta de trabalho de Tim Lopes, morto durante uma investigação sobre prostituição infantil em bailes funk do Rio de Janeiro, à época controlados pela mesma facção criminosa ligada à família do cantor.
Tim Lopes morreu em 2 de junho de 2002 e, em 2 de junho de 2025, a Dazed lança essa capa.
— Nanda Xie (@nandaxxie) June 3, 2025
Na capa? Oruam, filho de Marcinho VP, com o busto de Elias Maluco — o assassino de Tim — cravado na pele. Um escárnio.
A barbárie virou fetiche. Aplaudem o crime como se fosse arte. É a… pic.twitter.com/r7DpakWEjh
A revista também apresenta Oruam como um jovem tímido e talentoso, criado num lar evangélico, destacando o carinho familiar pelos seus poemas. Contudo, essa tentativa de suavização da imagem do funkeiro contrasta fortemente com sua relação com figuras como Elias Maluco — responsável pela execução de Tim Lopes — a quem Oruam já se referiu como “tio”. Elias comandou a tortura e o assassinato do jornalista, que foi queimado vivo após sofrer mutilações com uma espada de samurai.
A reportagem ainda critica o chamado “PL Anti-Oruam”, apresentado pela vereadora de São Paulo Amanda Vettorazzo (União), que busca impedir o uso de verbas públicas em eventos que façam alusão ao crime organizado
Entretanto, Oruam não faz questão de esconder sua afinidade com o Comando Vermelho. Ele já foi filmado interpretando músicas que exaltam diretamente a facção, como “Faixa de Gaza”, de MC Orelha, com versos que afirmam: “Comando Vermelho RL até o fim”. Além disso, participou de faixas ao lado de MC Poze do Rodo, ex-integrante confesso do CV, preso recentemente por apologia ao crime organizado.
Oruam não esconde sua afinidade pela facção criminosa. As ligações além das conexões familiares. O envolvimento com figuras associadas ao tráfico não para por aí.
Oruam e sua companheira, Fernanda Valença, foram padrinhos do casamento de Poze com Vivi Noronha — apontada pela Polícia Civil do Rio de Janeiro como envolvida em esquemas de lavagem de dinheiro da facção criminosa.
A matéria da Dazed, embora procure criar uma narrativa de superação e arte, ignora o simbolismo e o peso histórico da data escolhida. Para muitos, a publicação representou um desrespeito à memória de Tim Lopes e um aceno perigoso à normalização de criminosos no cenário cultural.
Com informações da Revista Oeste
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